segunda-feira, 8 de junho de 2009

Fez-se Justiça

Meditação Sobre os Poderes

Rubricavam os decretos, as folhas tristes
sobre a mesa dos seus poderes efémeros.
Queriam ser reis, czares, tantas coisas,
e rodeavam-se de pequenos corvos,
palradores e reverentes, dos que repetem:
és grande, ninguém te iguala, ninguém.
Repartiam entre si os tesouros e as dádivas,
murmurando forjadas confidências,
não amando ninguém, nada respeitando.
Encantavam-se com o eco liquefeito
das suas vozes comandando, decretando.
Banqueteavam-se com a pequenez
de tudo quanto julgavam ser grande,
com os quadros, com o fulgor novo-rico
das vénias e dos protocolos. Vinha a morte
e mostrava-lhes como tudo é fugaz quando,
humanamente, se está de passagem,
corpo em trânsito para lado nenhum.
Acabaram sempre a chorar sobre a miséria
dos seus títulos afundados na terra lamacenta.
José Jorge Letria, in "Quem com Ferro Ama"

Banqueteiam-se a pavoneiam-se ainda, mas hoje deu para perceber que toda a arrogância e pequenez pententeada conduziram à revolta e um novo ciclo que se prevê de mudança e de justiça.

Não podemos esmurecer, mas sim, continuar a lutar.

Justitia Mater
Nas florestas solenes há o culto

Da eterna, íntima força primitiva:
Na serra, o grito audaz da alma cativa,
Do coração, em seu combate inulto:

No espaço constelado passa o vulto

Do inominado Alguém, que os sóis aviva:

No mar ouve-se a voz grave e aflitiva
D'um deus que luta, poderoso e inculto.

Mas nas negras cidades, onde solta

Se ergue, de sangue medida, a revolta,

Como incêndio que um vento bravo atiça,

Há mais alta missão, mais alta glória:

O combater, à grande luz da história,

Os combates eternos da Justiça!

Antero de Quental, in "Sonetos"

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